As grandes mudanças sociais são marcadas por grandes acontecimentos que têm em seu enredo indivíduos como personagens, ícones que influenciaram a forma de pensar de uma grande massa, levando a mudanças expressivas.
Gandhi, protestou por cerca de 40 anos contra a opressão britânica à Índia, sempre se mantendo fiel à vivência da não violência, levando a Índia à independência em 1947.
Quando olhamos para os acontecimentos sociais, é muito comum darmos causa e consequência ao encadeamento de fatos. Por exemplo, a independência da Índia se deveu a ação de um grupo, liderada por Gandhi. Acredito particularmente que esse olhar não está de todo errado. No entanto, se pensarmos não somente nas causas externas, surge a questão, qual a relação das mudanças do meio com o inconsciente coletivo de um povo?
Jung em seu livro “A Natureza da Psique” traz um olhar diferenciado para essa questão:
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“De hábito, as mudanças profundas na história são atribuídas exclusivamente a causas exteriores. Contudo, estou convencido de que as circunstâncias exteriores frequentemente são por assim dizer meras ocasiões para que se manifeste uma nova atitude perante a vida e o mundo, preparada inconscientemente desde longa data”
“Condições sociais, políticas e religiosas gerais afetam o inconsciente coletivo, no sentido de que todos aqueles fatores que são reprimidos na vida de um povo pela concepção do mundo ou atitudes predominantes se reúnem pouco a pouco no inconsciente coletivo e ativam seus conteúdos.”
“Em geral, um ou mais indivíduos dotados de intuição particularmente poderosa tomam consciência de tais mudanças ocorridas no inconsciente coletivo e as traduzem em ideias comunicáveis.”
“Estas ideias se propagam rapidamente, porque ocorreram também mudanças semelhantes no inconsciente. Há uma disposição geral a aceitar as novas ideias, embora, por outro lado, elas encontrem também uma resistência violenta.”
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“As ideias novas não são apenas inimigas das antigas; elas surgem, em geral, também sob uma forma praticamente inaceitável para a antiga atitude.”
As mudanças sociais, segundo ele, portanto, estão sendo preparadas há muito tempo e puderam ser trazidas de um inconsciente e colocadas em um meio por indivíduos intuitivos.
Mas o que é um indivíduo intuitivo?
Jung fez um profundo estudo da relação do ser humano com o inconsciente, a qual se estabelece na consciência através da relação Ego – Self, ou seja, quando um elemento inconsciente é trazido por sonhos, sincronicidade, sintoma ou criatividade, elaborado pelo ego, se tornando, portanto, consciente. No entanto, existe uma maneira direta de acesso ao inconsciente, em que não necessariamente acontece a elaboração para o entendimento, como é o caso da intuição. Jung definiu a intuição como “uma capacidade de acessar, um insight, uma percepção, uma apreensão, um entendimento da situação, de maneira não-racional.” [1]
“A intuição decorre de um processo inconsciente, dado que o seu resultado é uma ideia súbita, a irrupção de um conteúdo inconsciente na consciência. A intuição é, portanto, um processo de percepção, mas, ao contrário da atividade consciente dos sentidos e da introspecção, é uma percepção inconsciente.” [1]
Sendo inconsciente, pode-se considerar que a informação acessada pode ser de um universo do inconsciente pessoal ou coletivo.
Assim, a percepção pela intuição nos coloca em contato com nosso Self, com as nossas programações do inconsciente pessoal, com os instintos e os arquétipos que formam o inconsciente coletivo.
No caso citado do indivíduo intuitivo que “comunicou as ideias do inconsciente coletivo”, pode-se pensar que ele estava vivendo num momento social propício para uma determinada mudança acontecer e teve CORAGEM de colocar em prática esse conteúdo do inconsciente coletivo por ele acessado.
O ingrediente coragem, a meu ver, é um ingrediente fundamental. Como percussor de ideias novas, ele receberá resistência, muitas vezes de maneira violenta. Haja visto o assassinato de tantos “bruxos” ou “cientistas” que traziam conhecimentos diferentes da grande massa e principalmente do sistema de poder vigente.
Isso tudo me traz reflexões profundas: Qual seria a minha responsabilidade ao perceber a necessidade de mudanças no meu pequeno mundo? Ou do grande mundo ao nosso redor? Qual o meu papel ao ter insights e percepções que trazem uma nova forma de pensar e agir num contexto de melhora social?
Embora Jung tenha colocado que “indivíduos dotados de intuição poderosa” acessam mais facilmente as mudanças no inconsciente coletivo, hoje já se sabe que a intuição é uma capacidade de TODOS! Uma potencialidade de acesso ao inconsciente que alguns têm mais desenvolvida e outros menos, mas todos têm.
Aceitar essas percepções, honrar e desenvolver a intuição é muito mais do que adquirir uma ferramenta a mais para entender o mundo, é tomar posse desse lugar de agente ativo. É saber que se uma mudança estiver “madura” no inconsciente, ela vai acontecer. E estar aberto para traduzi-las em ideias comunicáveis é se conectar com o fluxo das mudanças universais.
1: Jung, C.G. A Natureza da Psique, VIII/2, Ed. Vozes, 2000.
Conforme o texto diz sobre a importancia de se ter CORAGEM de se ouvir, penso ser apropriado falar o que significa a palavra coragem, cor=coração, agem=agir.
Bela observação Elisabeth.. é uma boa definição!
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